Os médicos brasileiros poderão realizar consultas online, assim como telecirurgias e telediagnóstico, entre outras formas de atendimento médico à distância. É o que estabelece a Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.227/18, que será publicada nesta semana. Elaborada após inúmeros debates com especialistas e baseada em rígidos parâmetros éticos, técnicos e legais, a norma abre portas à integralidade do Sistema Único e Saúde (SUS) para milhões de brasileiros, atualmente vítimas da negligência assistencial.
Para o presidente do CFM, Carlos Vital, trata-se de um novo marco para o exercício da medicina no Brasil. “As possibilidades que se abrem no Brasil com essa mudança normativa são substanciais e precisam ser utilizadas pelos médicos, pacientes e gestores com obediência plena às recomendações do CFM. Acreditamos, por exemplo, que na esfera da saúde pública essa inovação será revolucionária ao permitir a construção de linhas de cuidado remoto, por meio de plataformas digitais”, destacou Vital.
Segundo ele, além de levar saúde de qualidade a cidades do interior do Brasil, que nem sempre conseguem atrair médicos, a telemedicina também beneficia grandes centros, pois reduz o estrangulamento no sistema convencional causado pela grande demanda, ocasionada pela migração de pacientes em busca de tratamento.
O ponto de partida para a elaboração da recém-aprovada Resolução, segundo o conselheiro federal Aldemir Soares, relator da medida, foi colocar a assistência médica no País em sintonia com os avanços das tecnologias digitais e eletrônicas, hoje tão dinâmicas e presentes no cotidiano das pessoas. “Com esta norma, o CFM acompanha a evolução tecnológica, buscando garantir a segurança na assistência aos pacientes”, explica.
Para assegurar o respeito ao sigilo médico, por exemplo, um princípio ético fundamental na relação com os pacientes, todos os atendimentos devem ser gravados e guardados, com envio de um relatório ao paciente. “Sempre deverá ser mantida a confidencialidade, pois precisamos ter certeza de que não haverá vazamento das informações trocadas entre médico e paciente, seja por meio da atuação de hackers, ou por indiscrição dos profissionais”, destacou Soares.
Outro ponto importante será a concordância e autorização expressa do paciente ou seu representante legal − por meio de consentimento informado, livre e esclarecido, por escrito e assinado – sobre a transmissão ou gravação das suas imagens e dados.
A Resolução CFM nº 2.227/18, que entra em vigor três meses após a data de sua publicação, ainda define e detalha os requisitos necessários para a realização de cada um dos procedimentos ligados ao tema, como telemedicina, teleconsulta, teleinterconsulta, telediagnóstico, telecirurgia, teleconferência, teletriagem médica, telemonitoramenteo, teleoientação e teleconsultoria.
Teleconsulta
A resolução estabelece que a telemedicina é o “o exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, educação, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde”, podendo ser realizada em tempo real (síncrona), ou off-line (assíncrona). Já a teleconsulta é a consulta médica remota, mediada por tecnologias, com médico e paciente localizados em diferentes espaços geográficos.
A primeira consulta deve ser presencial, mas no caso de comunidades geograficamente remotas, como florestas e plataformas de petróleo, pode ser virtual, desde que o paciente seja acompanhado por um profissional de saúde. Nos atendimentos por longo tempo ou de doenças crônicas, é recomendada a realização de consulta presencial em intervalos não superiores a 120 dias.
Soares explica que, com a tecnologia atual, já é possível a realização de exames de ouvido ou de garganta à distância, sendo necessária, apenas, a presença de um profissional de saúde do outro lado para ajudar o paciente. Nesses casos, são necessários computador, câmera e o equipamento da especialidade.
A resolução também estabelece regras para as teleconsultas, como a concordância do paciente com este tipo de atendimento, o armazenamento das informações nos Sistemas de Registro Eletrônico/Digital das respectivas instituições e o encaminhamento ao paciente de cópia do relatório de atendimento, assinado digitalmente pelo médico responsável pelo teleatendimento.
Estabelece ainda que, no caso de prescrição médica à distância, ela deverá conter identificação do médico, incluindo nome, número do registro no CRM e endereço, identificação e dados do paciente, além de data, hora e assinatura digital do médico.
Telediagnóstico
A emissão de laudo ou parecer de exames, por meio de gráficos, imagens e dados enviados pela internet, é definida como telediagnóstico, que deve ser realizado por médico com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) na área relacionada ao procedimento. Já a teleinterconsulta ocorre quando há troca de informações e opiniões entre médicos, com ou sem a presença do paciente, para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico. É muito comum, por exemplo, quando um médico de Família e Comunidade precisa ouvir a opinião de outro especialista sobre determinado problema do paciente.
Na telecirurgia, o procedimento é feito por um robô, manipulado por um médico que está em outro local. A Resolução do CFM estabelece, no entanto, que um médico, com a mesma habilitação do cirurgião remoto, participe do procedimento no local, ao lado do paciente. “Com isso, garantimos que a cirurgia terá continuidade caso haja alguma intercorrência, como uma queda de energia”, explica Soares.
A teleconferência de ato cirúrgico, por videotransmissão síncrona, também é permitida, desde que o grupo receptor das imagens, dados e áudios seja formado por médicos. A teletriagem médica ocorre quando o médico faz uma avaliação, à distância, dos sintomas para a definição e direcionamento do paciente ao tipo adequado de assistência necessária.
Já a teleorientação vai permitir a declaração de saúde para a contratação ou adesão a plano de saúde. Na teleconsultoria, médicos, gestores e profissionais de saúde poderão trocar informações sobre procedimentos e ações de saúde. Por fim, o telemonitoramento, muito comum em casas de repouso para idosos, vai permitir que um médico avalie as condições de saúde dos residentes.
“Com esse serviço, evitaremos idas desnecessárias a pronto-socorros. O médico remoto poderá averiguar se uma febre de um paciente que já é acompanhado por ele merece uma ida ao hospital”, assinala Soares.
Segurança
Para garantir a segurança das informações, os dados e imagens dos pacientes devem trafegar na internet com infraestrutura que assegure a guarda, manuseio, integridade, veracidade, confidencialidade, privacidade e garantia do sigilo profissional das informações.
“Não há dúvida de que esta inovação tecnológica traz uma grande contribuição para o atendimento dos pacientes, mas, como em qualquer ato de saúde, o paciente precisa ter certeza de que existe uma estrutura de governança confiável no local. A qualidade e a segurança do atendimento deve ser uma prioridade nesses pontos de atendimento”, aponta Soares
Para o relator, uma das diferenças entre a regulamentação brasileira e a dos Estados Unidos ou da União Europeia, onde já existem normas para este tipo de atendimento, é a rigidez para com a segurança das informações. Segundo a norma do CFM, cabe ao médico preservar todos os dados trocados por imagem, texto ou áudio entre médicos, pacientes e profissionais de saúde.
Toda empresa voltada a atividades na área de telemedicina, sejam elas de assistência ou educação continuada a distância, também deverá cumprir os termos da resolução. Será obrigatório o registro da empresa que explore o serviço no Cadastro de Pessoa Jurídica do CRM da jurisdição, com a respectiva responsabilidade técnica de um médico regularmente inscrito.
Quando se tratar de prestador de serviços Pessoa Física, o mesmo deverá ser médico devidamente habilitado junto ao Conselho e a ele caberá estabelecer vigilância constante e avaliação das técnicas de telemedicina no que se refere à qualidade da atenção, relação médico-paciente e preservação do sigilo profissional.
Fonte: Conselho Federal de Medicina